A ideia da liberdade está sob ataque no Brasil. Vivemos tempos difíceis – corrupção generalizada, grande violência, injustiça social sempre presente, desgaste dos valores morais e outras coisas assim -, e isso vem gerando profundo “mal-estar” na sociedade brasileira. Hoje ninguém está satisfeito com a situação.
Aí começaram a aparecer “salvadores/as” da pátria, líderes políticos que garantem ter soluções rápidas e fáceis para todos os nossos problemas. Mas, as ideias que apresentam ferem de morte a democracia e a noção de liberdade individual – intervenção militar, grande repressão policial, censura aos meios de comunicação, maciça intervenção do governo nas atividades econômicas e por aí vai.
Ora, liberdade individual e democracia são valores muito importantes, essenciais para uma vida digna. E esses direitos, no Brasil, foram reconquistados a duras penas, depois de cerca de 20 anos de ditadura. E posso garantir a você que não é nada bom viver numa ditadura…
Esse é o caso em que o “remédio” (as medidas anti-democráticas) acaba por matar o “doente” (a democracia em crise), ao invés de curá-lo.
É preciso entender melhor o problema – o que vem levando o Brasil a essa situação de mal-estar -, pois só assim será possível encontrar o “remédio” correto, aquele que não venha a causar mais mal do que bem. E para fazer isso começo com uma pergunta: O que sustenta a ideia de liberdade individual?
O autor cristão Os Guiness respondeu essa questão criando o conceito do “triângulo da liberdade”. Nesse “triângulo”, cada vértice corresponde a um conceito extremamente importante. E essas ideias interagem entre si e se sustentam mutuamente.
O começo do triângulo
O primeiro vértice do triângulo, o ponto de partida, é o conceito de liberdade individual. Trata-se do direito de crer livremente no que se desejar, de ir e vir como se quiser e agir segundo a própria vontade, naturalmente respeitando o direito das outras pessoas.
Sem liberdade, a vida perde encanto e significado. E liberdade é um direito que nos foi dado por Deus e, portanto, ninguém tem o direito de tirá-la das pessoas.
Liberdade requer virtude
O segundo vértice do triângulo é o conceito de virtude, ou seja, a ideia que as pessoas precisam ter princípios morais que governem suas ações. Coisas como respeito à vida e aos direitos de todas as pessoas, o fato que todo mundo é igual aos olhos da lei e assim por diante.
Só é possível para uma sociedade administrar bem a liberdade individual quando as pessoas tem virtude, ou seja, quando elas se comportam da forma correta mesmo quando não estão sendo obrigadas a isso (veja mais).
Liberdade individual sem virtude gera bagunça, desrespeito e alimenta a noção de cada um por si, que leva à desagregação social.
Virtude requer fé
Estabelecer padrões morais absolutos, aqueles que a sociedade aceite e venha obedecer, requer um processo para definir aquilo que é certo e errado, ensinar essas regras às pessoas e controlar o compromisso das pessoas em obedecê-las. E, acima disso tudo, é preciso ter confiança (fé) na integridade desse processo, isto é, se as regras justas estão sendo instituídas, ensinadas e cobradas das pessoas.
Portanto, virtude requer fé, que vem a ser o terceiro vértice do “triângulo da liberdade”. Sem fé no processo que estabelece e controla as regras morais, a virtude nunca prospera de fato.
Fé requer liberdade
Fechando o ciclo, é preciso lembrar que a fé requer liberdade de pensamento. Sem tal liberdade, as pessoas não aceitam de fato as regras morais existentes e, portanto, não se comprometem com elas.
Não é possível ter fé verdadeira sem ter liberdade para escolher as coisas nas quais se quer acreditar.
Como superar a crise no Brasil
Resumindo, o “triângulo da liberdade” começa com a liberdade. O segundo vértice é a virtude (compromisso com regras morais), sem o que a sociedade caminha para o caos. Para que haja virtude é preciso haver fé no processo que estabelece e controla essas regras. Fechando o triângulo, fé só pode florescer num meio onde haja liberdade de pensamento. Portanto, liberdade, virtude e fé se complementam e se sustentam mutuamente.
É por isso que a Constituição brasileira, assim como as demais constituições democráticas existentes no mundo, inclui liberdades individuais, inclusive de crença, e regras de comportamento, que pretende garantir o respeito aos direitos individuais.
Onde, então, a sociedade brasileira está falhando? Por que esse “triângulo da liberdade” está se esgarçando a olhos vistos? Acho que a resposta é evidente: Falta virtude entre nós, isto é, não há princípios morais adequados, amplamente aceitos e que sejam cumpridos por todo mundo.
A sociedade brasileira sempre foi caracterizada pela ambiguidade no aspecto moral – somos adeptos do “jeitinho”, da ideia que é sempre bom levar vantagem em tudo e de outras pequenas espertezas. Os princípios morais no Brasil são frágeis e muita gente pensa ser possível, e até bom, viver sem obedecer muito às regras.
A Constituição brasileira é bastante liberal, como já disse, garante liberdade para todo mundo. Mas nossa constituição não trata da virtude e das responsabilidades que devem acompanhar e temperar essas liberdades. E o resultado é aquele que estamos colhendo hoje.
Como estão sentindo na pele os efeitos da situação meio caótica gerada pela liberdade excessiva, não temperada pela virtude, os/as brasileiros/as estão perdendo a fé no processo como um todo e daí vem a teses que não tem conserto, se não mudarmos tudo que está aí, acabando com a “bagunça” através do rigor e da restrição à liberdade. Essa é a origem das ideias anti-democráticas.
O triângulo se rompeu quando um elo falhou: falta virtude entre nós – princípios morais governando a vida das pessoas.
Evidentemente, o povo cristão tem um papel fundamental no reparo desse “triângulo”, pois o cristianismo se apoia em princípios morais fortes e na sua aceitação através da mudança interior das pessoas (o que a Bíblia chama de “santificação”).
Sabemos que os princípios morais nos quais acreditamos foram dados por Deus e por isso são os melhores possíveis. E temos total fé (confiança) neles.
E precisamos passar isso para a sociedade. Primeiro, dando o exemplo daquilo que pregamos, ou seja, vivendo os princípios nos quais acreditamos. Depois, ensinando esses princípios (o que tem a ver com a pregação do Evangelho de Cristo) e ajudando a convencer a sociedade que essa é a única saída para a crise na qual nos encontramos.
Enquanto isso não for feito, o “triângulo da liberdade” continuará instável e o Brasil sempre estará correndo o risco de aventuras políticas.
Com carinho